Saturday 16 January 2010

Does size matter?

Tenho andado um pouco embasbacado com a dimensão, a dimensão da obra de arte.
Para um tipo como eu, com uma janela de atenção de cerca de três minutos antes de o cérebro virar para outras paragens (olha, que giro, porque é que aquele coelho está a olhar para mim?), tenho mesmo dificuldade em perceber como se estruturam, como se criam com a dimensão de unidade, de coerência interna, obras tão extensas como a oitava sinfonia de Bruckner, ou como a segunda de Rachmaninoff que ouvi outro dia na Philarmonie, ou romances como os de que falou Pamuk outro dia como o Crime e Castigo ou o Anna Karenina, ou mesmo outros pequenos, como o que acabei de ler ontem, Terra Sonâmbola, de Mia Couto.
Como consegue um autor dirigir um pensamento, por exemplo o musical, em frases tão amplas, ondas de tensão e distensão que acompanho mas que nem sempre sei onde me levam.
Quando ouvimos Mozart, basta segui-lo. Sentimo-nos como uma criança de sete anos de mão dada com o Pai a atravessar a estrada, perfeitamente confiantes e seguros de estarmos no caminho certo. Seguimos o pensamento musical. Não quero com isto dizer: sabemos exactamente o que esta música nos quer dizer, como "esta música simboliza uma imagem primaveril, com passarinhos a cantar, folhas amarelas abanando levemente nas árvores e o cheiro a relva molhada emanando da terra". Mas há uma intuição, o nosso espírito "percebe".
Mas nestas obras de dimensão infinita, sinto-me perdido. Nem sempre a minha intuição consegue encontrar o seu espaço quando a oiço, e ainda menos o meu intelecto sentir-se guiado ou interpelado para algo vagamente concreto. Sim em pequenos segmentos, mas algures de seguida, passado um, dois, dez minutos, perde o todo.
Mas mais que a dificuldade na apreensão, é o problema da concepção que me intriga. É mesmo a tentativa de perceber como foi aquele pensamento estruturado na cabeça do autor. Perceber como, por exemplo, na Imortalidade de Kundera aquelas 10 páginas não estão lá aleatoriamente, mas fazem parte de uma matriz global da qual, se não apreendo o sentido, não apreendo a obra. E na oitava de Brucker, há muitas "dez páginas" em que não apreendo o sentido. E portanto, ainda não apreendi a obra.
Claro, é sabido que a oitava vai requerer de mim bem mais do que uma simples audição, que aquele monstro necessita de ser ouvido e digerido e, é verdade que nem tudo o que é bom tem de ser fácil e imediato.
Mas não deixa de intrigar a um tipo que escreve umas linhas e sente que escreveu uma coisa sem estrutura, meio devaneante, em que nem conseguiu dizer bem o que queria dizer, que alguém consiga explorar uma ideia ao longo de páginas e páginas de música ou prosa e com isso formar uma ideia coerente, uma unidade.

2 comments:

Unknown said...
This comment has been removed by the author.
Unknown said...

Continuo com a minha de que existem Grandes compositores que escreveram algo que é Universal, para toda a gente. Depois há outros, que também geniais comporam algo que é só para certas pessoas, com certas sensibilidades. Beethoven, Bach, Mozart, Schubert et al. têm uma universalidade inigualável. Doaram à arte algo que permanecerá. Outros, como Salieri, Bruckner, Wagner, Ravel, têm obras fenomenais mas que talvez só certas pessoas consigam perceber o total do sentimento que eles pretendiam demonstrar. Por mais que tente, a 2a de Bruckner, bonita e complexa, não me enche. Reconheço a arte, mas não é para mim. Faz sentido? O mesmo talvez aconteça com a literatura. Agora, alguém, ser humano, não gostar de Beethoven ou não apreciar a fluidez de Mozart? Impossível.